Audiência na Assembleia Legislativa reúne representantes políticos, produtores rurais e instituições para discutir ação judicial que pede indenização milionária e suspensão de atividades dos parques eólicos no município.
E mais uma vez, uma demonstração rara de união política, o prefeito de Serra do Mel, Kênio Azevedo (PP), o ex-prefeito e atual secretário de Articulação com as Vilas, Josivan Bibiano, e o produtor rural e adversário político histórico, Crispiniano Neto, se posicionaram juntos, em audiência pública realizada na sexta-feira, 11, na Assembleia Legislativa do RN, em defesa da permanência dos parques eólicos no município.
O evento foi promovido pelo deputado estadual Ubaldo Fernandes (PSDB), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Casa, e contou com a presença de diversas lideranças políticas, como os deputados Divaneide Basílio (PT), Fernando Mineiro (PT), Coronel Azevedo (PL) e Nelter Queiroz (PSDB).
O objetivo da audiência foi ouvir todos os lados sobre uma ação judicial movida pela Fetarn, CUT-RN e SAR-RN, que pede (para elas gerirem) mais de R$ 100 milhões em indenizações da empresa Voltalia, operadora de mais de 80 torres de energia eólica na região, além de sugerir a suspensão das operações.
Liderança local se destaca
O prefeito Kenio Azevedo foi enfático ao criticar a ação ressaltando que tudo se resolve no diálogo, o que não aconteceu antes da ação judicial. “Não concordo com a retirada ou paralisação das eólicas e vou trabalhar para que isso não aconteça”.
Ao lado do prefeito, o ex-prefeito Josivan Bibiano, que também é proprietário rural e participou da chegada das eólicas à Serra do Mel, quando estava como prefeito do município e reforçou:
“Que pena que nossos produtores não estão neste plenário. Não podemos esconder positivamente o impacto econômico nesses 12 anos. Nunca vou estar contra os meus produtores. Sou contra essa ação civil pública pelas coisas absurdas que colocaram. Em nome de todos os produtores: retirem a ação e vamos discutir melhorias”.
Apoio do adversário político surpreende
Crispiniano Neto, produtor rural da Vila Amazonas, ex-diretor da Fundação José Augusto e figura historicamente alinhada à oposição local, mais uma vez foi uma das vozes mais firmes contra a ação judicial: “Eu desafio a apresentarem uma única pessoa em Serra do Mel que tenha essa tal ‘síndrome da turbina eólica’. Essa ação foi feita por quem não conhece a nossa realidade e nem sabe onde fica Serra do Mel”.
Representante volta atrás e se arrepende
Durante a audiência, Ricardo Lins, presidente da associação da Vila Ceará e um dos signatários da ação, revelou que assinou o documento sem saber que seu objetivo era paralisar as torres “Achei que os pleitos eram outros. Me posiciono contra e assino a revogação do que assinei.”
Debate institucional e técnico
A diretora da Voltalia, Ariana Machado, afirmou que a empresa atua há 13 anos no município e nunca foi acionada para debates ou audiências anteriores. Ela reforçou que todos os contratos firmados passaram por análise e adesão voluntária dos produtores.
O deputado Coronel Azevedo (PL) apontou que antes da chegada da Voltalia, Serra do Mel tinha um dos menores PIBs per capita do RN, e que atualmente está entre os dez maiores do estado. Já o deputado Nelter Queiroz resumiu o sentimento dos colonos ao dizer: “A Serra do Mel não é da CUT, não é da Fetarn, é do povo que mora lá.”
Ministério Público e Defensoria ponderam
A promotora Kaline Cristina, representando o Ministério Público, destacou que o MP está ao lado do meio ambiente e recomendou a oitiva do Idema quanto ao licenciamento ambiental. Já a defensora pública Giovanna Burgos, de Assú, chamou o debate de “tardio”, mas necessário. “Pode ser uma pessoa apenas, mas se essa pessoa se sentir incomodada, ela pode entrar com ação. A audiência ajuda a trazer luz ao tema.”
O que diz a regulação?
Apesar do avanço no marco legal das energias renováveis no Brasil, incluindo a recém-sancionada Lei nº 15.097/2025, que trata de projetos eólicos offshore, não há atualmente qualquer norma federal ou estadual que fundamente a suspensão de atividades de parques eólicos onshore em operação, como os da Serra do Mel.
A atuação das empresas está sujeita a licenciamento ambiental via Idema/Ibama, e a fiscalização é feita por órgãos como a Aneel, que também não possui norma que justifique a paralisação. A alegação da chamada “síndrome da turbina eólica” não tem respaldo técnico consolidado.
Conclusão
A audiência demonstrou que, acima de diferenças partidárias, há consenso local na defesa da permanência dos parques eólicos e da manutenção dos contratos com os produtores rurais. Em um raro momento de união política, Kenio Azevedo, Bibiano e Crispiniano Neto mostraram que, quando se trata do futuro da Serra do Mel, as bandeiras partidárias podem ser baixadas em nome do interesse coletivo.
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