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Professor monta com recursos próprios museu que resgata história de Areia Branca; espaço possui salas de leitura e de cinema

MUSEUCasa Museu Máximo Rebouças depois da ampliação (Foto: Carlos Júnior)

Maricelio Almeida
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Em cada recanto, um fragmento da história do município de Areia Branca. Em cada um dos mais de 20 mil itens expostos um pouco da dedicação e abnegação do professor que há 10 anos decidiu recontar, através dos mais diversos tipos de objetos e com recursos próprios, sem nenhum tipo de colaboração do poder público ou da iniciativa privada, os principais acontecimentos de sua cidade. Idealizador da Casa Museu Máximo Rebouças, o docente que emprestou seu nome para o espaço que hoje se constitui como uma extensão de sua vida, se prepara para no início de 2014 reabrir a galeria de antiguidades ao público.

Inaugurada em 31 de outubro de 2003, a Casa Museu de Areia Branca esteve fechada ao longo dos últimos anos para uma grande reforma, concluída recentemente. Com expectativa de ser reaberto em 2 de janeiro do próximo ano, o espaço conserva uma variedade de itens que impressiona: lá, o visitante vai se deparar com fotos e informações a respeito dos primeiros moradores de Areia Branca, até elementos como garrafas encontradas em um navio naufragado na região em 1945, em plena segunda guerra mundial.

“Tudo começou através de um projeto que desenvolvi no povoado de Redonda, intitulado ‘Resgatando Areia Branca’. Decidi reunir objetos da comunidade, trazidos pelos próprios alunos. Achei interessante, então tive a ideia de criar o Museu, mas me preocupava com o tempo, me perguntava se ainda havia como conseguir peças tão antigas. O projeto aconteceu em setembro e no dia 31 de outubro já estava abrindo a Casa”, relembra Máximo Rebouças.

A primeira peça adquirida pelo professor foi um rádio, no próprio povoado de Redonda. “Troquei o rádio, que pertencia a uma senhora da comunidade, por um ventilador. Comecei a juntar, comprar objetos, as pessoas diziam que eu estava gastando dinheiro com besteira, ficando doido, mas gostava daquilo. Hoje essas mesmas pessoas já me elogiam, dizem que isso é importante para a cidade”, conta o professor, conduzindo a equipe de reportagem pela Casa Museu.

Logo na entrada, o público conhece a história do fundador de Areia Branca: Francisco de Borja, mossoroense, abolicionista, que chegou a então ilha desabitada em 1870. “Ele tinha uma visão de que um dia a Ilha prosperasse e se tornasse uma cidade grande. Por isso construiu a primeira casa de taipa, trouxe a mulher e cinco filhos”, diz Máximo Rebouças, acrescentando que o município possuiu outros dois nomes antes de ser oficialmente denominado como Areia Branca: Ilha de Maritacaca e Ilha de Areia Branca.

Seguindo pelos corredores, os visitantes encontram documentos que foram importantes para a cidade, como registros notariais de séculos passados. “São documentos que foram passando de geração em geração e que as famílias me doaram ou eu comprei”, explica o professor de inglês e artes, apaixonado por história.

Ainda nos primeiros corredores, é possível identificar como eram as residências construídas em Areia Branca após a sua fundação, através de uma série de quadros pintados pelo artista plástico Francisco Manuel. “Temos ainda aqui a primeira bandeira da cidade, datada de 1973 e um espaço dedicado especialmente para Deífilo Gurgel, a pessoa mais importante de nossa cultura. São objetos pessoais do advogado, historiador, poeta mais ilustre de Areia Branca”, comenta Máximo Rebouças.

Cadastrada em 2006 pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), a Casa preserva também inúmeras cédulas que circularam pelas mãos dos areia-branquenses de 1960 até os anos 2000 e moedas de 1870 a 1994. “Faço questão de dizer que todas as cédulas passaram de mão em mão aqui mesmo na cidade, não foram compradas pela internet ou algo parecido. Guardo ainda um modelo dos primeiros caixas eletrônicos da cidade, da década de 1990. Digo aos meus alunos quando eles vêm aqui que não fiz esse Museu para a geração atual, e sim para as futuras. Daqui a 50, 100 anos, tudo isso terá mais valor”, enfatiza o proprietário.

“Beleza Potiguar”

0Professor Máximo Rebouças, o idealizador e administrador do Museu (Foto/Reprodução: O Mossoroense)

No museu, há um espaço dedicado para a única mulher de Areia Branca que alcançou o título de Miss Rio Grande do Norte, na década de 1970: Elna Belém. A miss, hoje morando em Natal, doou roupas, jornais da época, acessórios utilizados por ela durante a competição.

Passando pelo espaço da “Beleza Potiguar”, o visitante chega ao “Corredor Francisco Moreira de Carvalho”. “É uma homenagem ao herói do povo pobre de Areia Branca, que ajudou a distribuir, igualitariamente, cestas básicas enviadas pelo Governo para população que aqui estava durante a seca de 1877. E é no “Corredor” que estão presentes fotografias de diversas personalidades que fizeram parte da história de Areia Branca, desde a mais humilde até a mais abastarda financeiramente. “Prefeito, parteira, são pessoas que prestaram serviço ao município”, explica Máximo Rebouças.

Além dos aproximadamente 20 mil itens expostos, outros 30 mil estão guardados em um galpão, por não haver espaço suficiente para organizá-los na Casa Museu. “Apenas 20% desse total foi doado, o restante fui eu quem comprei e continuo comprando. Quase todos os dias adquiro alguma coisa nova de pessoas que vêm a minha casa oferecendo objetos antigos. Quero que um dia isso tenha muito valor para a cidade. As pessoas hoje não dão muito valor à cultura, vou persistir muito ainda”, reflete Máximo, que gastou somente com a reforma do prédio cerca de R$ 120 mil, valor que será descontado totalmente do seu salário de professor da rede estadual de ensino até 2028. “Sobrevivo hoje com um salário de R$ 900 da rede municipal de Areia Branca e com a ajuda da mulher. Isso aqui é amor. Podem chegar oferecendo R$ 40 milhões que não vendo. Não quero”.

Acordando todos os dias por volta das 6h para limpar todo o prédio, de dois andares, localizado vizinho a residência, o professor, afastado da sala de aula pelo município para se dedicar ao projeto da Casa Museu, chega a dormir no espaço para protegê-lo. “Sou o vigilante daqui, durmo no primeiro andar, com meu colchonete, pois tenho medo de alguém invadir. É um trabalho árduo, que conto com a ajuda da família. O Museu será reaberto em 2 de janeiro, mesmo sem funcionários que me auxiliem”, relata o idealizador.

No andar térreo, há ainda uma sala reservada para o maior fotógrafo de Areia Branca, Antônio do Vale de Souza, que chegou a trabalhar com o mossoroense Manuelito; registros de campanhas políticas da cidade; medicamentos antigos, preservativos de 1980; canecas de Festivais de Chopp dos anos 1970; as primeiras cadeiras da igreja da cidade; o primeiro telefone e primeira televisão a cores do município; palmatória e objetos utilizados por professores da década de 1950, além de uma homenagem ao comerciante João Rebouças, dono da mercearia mais antiga de Areia Branca. “A mercearia abriu em 1955 e desde então funciona 24 horas por dia, nunca fechou”, revela Máximo Rebouças.

Fonte: Jornal O Mossoroense, edição de 8/12/2012

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