O Ministério Público Federal (MPF) denunciou, na quinta-feira, 6, o tenente-coronel da PM do Rio Grande do Norte André Luis Fernandes e mais onze integrantes de organização criminosa (Orcrim) responsável pelo contrabando aquaviário de cigarros do Paraguai para diferentes regiões do país. Também estão entre os denunciados o policial militar reformado Sildaire Gregório da Silva (“Sid”) e o cabo da PMRN Aldenir Garcia Silva (conhecido como “Careca”).
Segundo o MPF, o grupo era dividido em dois núcleos de atuação. O primeiro operacionalizava o escoamento, escolta e guarda dos produtos contrabandeados. Já o segundo núcleo realizava as operações financeiras para ocultar a origem e destino dos recursos. A investigação – com base em interceptações telefônicas, conversas em aplicativos de mensagens e planilhas financeiras – revelou a “plena estabilidade, clara divisão de tarefas e busca de perenidade na atuação da organização criminosa, que se valia do emprego de armas de fogo, de atuação transnacional e da participação de servidores públicos”.
Dados obtidos no Inquérito Policial dão a dimensão da Orcrim: em aproximadamente 18 meses, foram movimentados mais de R$ 16 milhões, por intermédio de pessoas físicas e jurídicas. Na tentativa de recuperar uma carga roubada em alto-mar, em 2017, o grupo chegou a alugar um helicóptero. A organização contava com pessoal armado no acompanhamento de cargas, a falta de fiscalização nas rodovias e eventual apoio das forças policiais para escoar os produtos para várias cidades, como Fortaleza (CE), Natal (RN) e São Paulo.
Liderança
O MPF aponta que o tenente-coronel Fernandes – preso pela Operação Níquel em janeiro e inserido no Sistema Penitenciário Federal – “é o líder e comandante da organização criminosa armada, com total domínio financeiro e operacional das atividades”. A denúncia comprova que ele “se valia do próprio efetivo policial do interior do Rio Grande do Norte para blindar sua organização e evitar que terceiros subtraíssem a mercadoria do grupo”.
Em celular apreendido na residência do tenente-coronel, conversas em grupo no aplicativo WhatsApp, com participação dos líderes, revelaram detalhes da operação. Os integrantes “possuíam doutrina de sigilo, com alertas sobre eventual acesso por parte da polícia do conteúdo das mensagens trocadas”. Para se blindar de investigações, os membros da Orcrim evitavam ostentar patrimônio, se esquivavam ou corrompiam a polícia e buscavam o enfrentamento de criminosos concorrentes.
Outro integrante apontado como líder do grupo é Assaf Elias Assaf (conhecido como “Gringo” ou “Libanês”). Com base em Foz do Iguaçu (PR), ele era responsável pelo financiamento e coordenação do fornecimento de cigarros. Os demais denunciados são: Leonardo Aparecido do Vale, Julierme Rodrigues de Souza, Thiago Bruno de Queiroz, José Raimundo Correa Moraes (“Pescada”), Tony Edson Ramos Agostinho Silva, Luciana de Souza Araújo Silva, Jardson da Silva (“Gago”) e Rameca do Nascimento Silva.
Eles devem responder pelo crime de organização criminosa armada (Art. 2º da Lei 12.850/2013), com pena de reclusão de três a oito anos, agravada pelo uso de armas de fogo e envolvimento de funcionários públicos. A pena do tenente-coronel Fernandes ainda é aumentada pelo papel de liderança da Orcrim. O grupo também é denunciado pelo crime de contrabando (Art. 334-A do Código Penal).
A denúncia tramita na 2ª Vara da Justiça Federal no RN, sob o nº 0800675-70.2020.4.05.8400.
Operação
A organização criminosa passou a ser investigada com o compartilhamento de provas obtidas pelo Ministério Público do Estado do RN e pela Força Nacional, no âmbito das operações “Limpidare” e “Caronte”, que apuram mais de uma centena de mortes violentas em Ceará-Mirim (RN).
Em janeiro, o grupo foi alvo de sete mandados de prisão preventiva e 16 de busca e apreensão cumpridos em Natal (RN), São Paulo e Abaetetuba (PA). Na ocasião, a PF apreendeu cigarros contrabandeados, armas de fogo, munições e elevada quantia em dinheiro.