Luciano Oliveira - [email protected]

Fala, Memória: Morre “Django”, personagem folclórico do Carnaval da Salinésia

Django morreu A última grande performance do “Django” (foto) de Areia Branca foi no Carnaval de 2007, quando foi homenageado pela prefeitura. Também foi destaque num dos carnavais do bloco Pererê. Isso, na atualidade, porque a partir do final dos anos 60 ele reinou absoluto na “pele” do personagem inspirado nos filmes de faroeste e em especial aqueles protagonizados pelo herói do bang-bang, “Django” (nas interpretações de atores como Giuliano Gemma e Franco Nero).

O outrora vigoroso carnavalesco partiu na manhã de ontem, 20, sem deixar pistas. As primeiras suspeitas apontavam para afogamento no paraíso de Baixa Grande. Por qual razão teria morrido afogado, o “Django”, se a beira-mar não era a sua praia?

Na pia batismal recebeu o nome de Francisco José Nunes. Já crescido se popularizou como “Chico de Gueleza”, período em que criou a performance carnavalesca “Django”. No carnaval, ele saia pelas ruas da cidade arrastando um caixão de defunto, tendo logo atrás a mocinha sob ameaças de cinco bandidos, todos vestidos a caráter. Em determinado ponto do trajeto paravam abruptamente e o artista, “Django”, iniciava um tiroteio com os bandidos, matando a todos e salvando a mocinha das ameaças dos facínoras. O público ia ao delírio com a performance de “Chico de Gueleza”. Digo, “Django”.

Em 2009 o Blog publicou no “Fala, Memória” um texto de Othon Souza que na verdade é um resgate impecável das peripécias do folclórico personagem “Django”. Em homenagem ao saudoso carnavalesco que apareceu morto ontem, boiando nas águas da praia de Baixa Grande, republicamos o material. Leia.

“DJANGO”

AREIA BRANCA QUADRA MARIA DUARTE hoje inssEssa era a Quadra Maria Duarte (hoje INSS) onde “Django” começava o tiroteiro 

Em 1966 chegava as telas de cinema o filme cult Django. Com direção de Sergio Corbucci e ator principal Franco Nero. Era mais uma contribuição ao surgimento do gênero western spaghetti, que ganhou notoriedade, principallmente com o também diretor, Sergio Leoni (Por um punhado de dólares; O bom, o mal e o feio), dando-lhe fama e prestígio internacional. Trata-se de um bangbang com Franco Nero fazendo o papel do antiherói. Sempre vestido de preto, com o fato inusitado de Django arrastar com uma corda um caixão de defunto, feito em madeira. Carregava-o para todo lugar. Em seu interior se encontrava uma metralhadora ao invés de um cadáver

Nos últimos anos de 1960 em Areia Branca, existiu uma figura folclórica, o qual incorporou tão bem o personagem, que desde então, autodenominou-se como tal e passou a ser chamado pela população de Django.

Era um sósia perfeito. Sempre com a barba por fazer e de indumentária, das botas ao chapéu, idêntico ao personagem. A semelhança era tão verossímil, que até hoje me pergunto: será que no seu íntimo, ele pensava mesmo que era o próprio?

No último dia de carnaval, Django atingia o ápice. A pessoa e o personagem se corporificavam, assim como numa transmutação de Franco Nero. Pairavam dúvidas de quem era quem. Ele saía pelas ruas da cidade, arrastando o seu caixão de defunto (em madeira). Logo atrás, naquele cortejo fúnebre, seguia-o uma súcia de malfeitores, todos fortemente armados. Tudo encenação! Nada mais que uma cena de teatro ao ar livre. Eles em plena rua e nós, sua platéia, de um lado e do outro da mesma, nas calçadas. Seguíamos ansiosos por ver a cena final, digna de inclusão na obra de William Shakespeare.

Quando o féretro chegou nas imediações do sobrado de João Rolim, em frente à quadra (hoje, INSS), bem em frente à Viação Nordeste, o tiroteio começava.

Ali, na época, era a grande concentração e o maior movimento dos brincantes. Tudo acontecia lá: desfile de blocos, escolas de samba, bloco de sujos, ursos, anônimos, mascarados, etc…Verdadeiro carnaval, literalmente falando.

Django começou a atirar e a ser revidado. Eram balas de festim para todo os lados. Os mais desavisados pensaram se tratar de um autêntico massacre, tal era uma grande saraivada, com cheiro forte de pólvora e fumaça. Víamos ao vivo o que se vê nos filmes atuais. Os atores corriam, caíam feridos e se fingiam de mortos. A produção era tão bem elaborada, pois víamos brotar manchas de sangue, tingindo a roupa dos mortos e feridos. Verdadeira apoteose, digna de uma comissão de frente na Sapucaí.

Ao término do espetáculo, Django e o seus eram ovacionados pelo público em êxtase! Os atores reverenciavam e agradeciam ao público, que se encontrava em estado de graça!

Com todos já refeitos e relaxados, Django abria o caixão, retirando do seu interior uma garrafa de aguardente, que servia a sua trupe.

Othon Souza, filho do prático Zé Antonio e de ”Belezinha”. Nascido em Natal, teve sua gênese em Areia Branca a partir dos últimos anos da década de 60, quando para cá se dirigia nas férias escolares. Graduou-se Engenheiro Agrônomo e pós-graduou-se mestre em agronomia, pela antiga ESAM, em 1996. Atualmente reside em Rio Branco, capital do Acre.

Print Friendly, PDF & Email

Compartilhe:

guest

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments

publicidade