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Fala, Memória: Do Mosteiro dos Jerônimos à igreja matriz de Areia Branca

*Evaldo Alves de Oliveira

CRISTO FALA, MEMÓRIA Desde o século passado que as três badaladas do sino da igreja anunciam que alguém morreu. Em Areia Branca também os sinos dobram, com três toques carregados de tristeza, sendo o primeiro mais longo e grave, seguido de dois mais agudos e curtos. Em uma época em que não havia nem telefone fixo, aquela era a forma mais simples de convidar as pessoas para o velório. E o disse me disse entre as pessoas durava o dia todo, até a hora do enterro.

As procissões da Semana Santa emocionavam a todos, com sua pesada aura de sentimentalismo e religiosidade. E uma imagem se destacava, e ainda hoje faz brotar lágrimas nos olhos das pessoas de muitas procissões, revivendo antigos sentimentos. É a imagem de Cristo carregando a cruz, retratado quase de joelhos, com o sofrimento a lhe marcar as feições.

E ficou cravada em minha mente a figura de Cristo, quase de joelhos, com uma cruz de madeira nos ombros. Mas o vigor da imagem foi perdendo as cores em minha lembrança, a ponto de se tornar embaçada, turva, quase apagada.

Passeando por Portugal, Lisboa, Mosteiro dos Jerônimos, capela lateral, já quase de saída, a surpresa: uma imagem de Cristo, quase de joelhos, carregando uma pesada cruz de madeira. Parei, olhei e concluí: já vi esta imagem. Onde? Já vi inúmeras imagens de Cristo pelas igrejas do mundo, mas aquela tinha um sentido especial. E repassei as grandes catedrais do mundo, que conheci em minhas peregrinações. E, como em um filme, as imagens foram se sucedendo: São Pedro, em Roma… Milão, na Itália… Barcelona, na Espanha… Santiago de Compostela, na Espanha… Catedral de Sevilha… de Burgos, na Espanha… Catedral de Berlim, de Praga, de Budapeste, de Paris, de São Paulo, em Londres, na Eslováquia… e o filme continuou passando em minha mente. De repente, parou. Não havia qualquer dúvida: foi na Igreja de Nossa Senhora da Conceição, em Areia Branca.

A mesma imagem do nosso Cristo, quase de joelhos, com uma grande cruz de madeira nos ombros, com aquele olhar sem brilho, meio perdido, que todos nós reverenciamos, está na igreja de Areia Branca, do mesmo modo que na capela do Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa.

Quem viajar, verá.

(*) Evaldo Alves de Oliveira, médico e escritor. Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN

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