Mirabô Dantas, uma das maiores expressões da música potiguar
Mirabô Dantas é cantor, compositor e escritor. Potiguar nascido em Areia Branca. Morou no Rio de Janeiro nas décadas de 80 e 90 e foi presidente do sindicato dos músicos. Gravou um compacto pela CBS, ainda em vinil, e lançou, em 2007, o seu primeiro CD, de forma independente. Junto com o CD, Mirabô lançou seu livro de memórias musicais: “Umas histórias, outras canções”.
Em homenagem ao extraordinário músico areia-branquense, o Blog reproduz um trecho do livro “Umas histórias, outras canções”, do mestre Mirabô Dantas.
Chegando e Cantando
“Em 1975, eu havia deixado Natal para ir morar em São Paulo. Já estava ali há mais de um ano e não conseguia me adaptar à cidade. Nos meus momentos de reflexão, eu não me via ali, apesar de ter consciência de que aquela cidade era o maior centro cultural e econômico do país. Às vezes, tentava me convencer a ficar, lembrando-me de que muitos movimentos de vanguarda nasceram ali: a semana de arte moderna, o tropicalismo, o teatro de Zé Celso, as produções teatrais como O Balcão, etc. Mas eu me acostumara com o calor de Natal e naquele momento eu sentia frio. Um frio que ia além do corpo. Um frio na alma. Apesar do apoio moral vindo do poeta e parceiro musical, o jornalista Dailor Varela, responsável pela minha ida para aquela capital, chegou um dia que não deu mais para ficar. Apoiado por Odaíres, com quem estava casado na época, juntei os poucos trapos que tínhamos e, com nosso filho, Carlo Gil, nos mandamos para o Rio de Janeiro, onde moravam suas irmãs Grace (já com emprego certo) e Terezinha de Jesus, que estava tentando consolidar sua carreira de cantora, o que realmente aconteceu. Terezinha, algum tempo depois, chegou a ser contratada pela gravadora CBS onde ainda gravou cinco discos, todos eles contendo, além de outras, uma música de minha autoria em parceria com o poeta e amigo José Carlos Capinan.” …
“Naqueles primeiros dias de Rio de Janeiro, fui ao teatro João Caetano a fim de ver um show beneficente, daqueles em que vários artistas se apresentam, cada um cantando um número limitado de músicas. Vários artistas já consagrados no cenário musical brasileiro iam se apresentar. Terezinha, com quem eu tinha ido, ao ver o compositor Geraldo Azevedo, de quem já era amiga, tratou logo de nos apresentar, embora nós já soubéssemos algumas coisas um do outro, pois tínhamos um amigo em comum, o escritor pernambucano Jomard Muniz de Brito, o qual, sempre que vinha a Natal, falava de Geraldo para mim e vice-versa. Enfim, já nos conhecíamos, faltava era ficarmos cara a cara. Geraldo, depois de um abraço demorado e sincero, foi logo me perguntando:
– Vai cantar, velho?
– Claro que não! Estou chegando agora… O que é que eu vou fazer no meio de tanta estrela? Ainda mais num teatro desses… No Rio de Janeiro… Tá doido? – Eu disse.
– E eu? Você acha que sou esse famoso todo? Estou começando agora – completou. E continuamos ali conversando. Eu feliz por ter finalmente conhecido aquela pessoa que todos os amigos tem como um grande companheiro.
Continuávamos tagarelando ali atrás do palco, quando o produtor do espetáculo chegou perto de nós e falou para Geraldo que o show ia começar e ele seria um dos primeiros a se apresentar. A essa altura, o compositor de Caravana pediu para que eu ficasse ali, pois continuaríamos a conversa depois de sua apresentação. Dali mesmo detrás do palco e ao lado de outros cantores participantes do evento, fiquei assistindo a tudo com certo olhar de deslumbramento. O show foi iniciado. Cada artista a se apresentar cantava três músicas e em seguida ia chamando o próximo.
Chegou finalmente a vez de Geraldo Azevedo que, depois de cantar duas músicas, falou para a platéia que o ouvia atenta:
– Gente! Eu, como todos os que se apresentaram até agora, teria que cantar três músicas. Mas acabei de conhecer um cara que já era meu amigo há muito tempo, embora nunca tivéssemos nos encontrado. Ele é do Rio Grande do Norte, é compositor e recém-chegado ao Rio. Vai cantar a terceira música a que tenho direito. E me anunciou.
Entrei naquele palco meio que no susto. Recebi o violão das mãos de Geraldo e cantei A Quem Interessar Possa, uma canção que fiz em parceria com o paraibano José Nêumanne Pinto (atualmente comentarista político do telejornal do SBT) sobre um cordel de Leandro Gomes de Barros e uma citação de Oswald de Andrade que diz:
Saibam quantos
Esta canção ouvirem
Que te amo
Do amor maior
Que possível for
Tomo tua mão
Não sou seu amo e senhor
Sou só teu amor
E és meu amor também
Mil cento e vinte anos
Eu vivi no abandono
Porém quem ama tem força
Vence fome, sede e sono
O amor nasce no mundo
Já destinado ao seu dono
O público, que lotava o teatro João Caetano, foi mais do que generoso comigo: não só me aplaudiu bastante como ainda me fez cantar mais uma. Geraldo voltou ao palco, me abraçou e, além de ser aplaudidíssimo pelo gesto, também cantou finalmente a terceira música a que tinha direito, lógico, a pedido da calorosa platéia. Foi assim a minha primeira apresentação no Rio de Janeiro.”
(Trecho retirado do livro “Umas histórias, outras canções” de Mirabô Dantas, Natal, RN – 2007 – Págs. 37 a 39.)
Contatos com Mirabô para adquirir o livro e o CD Mares Potiguares: [email protected]
Fonte: http://falasmusicais.blogspot.com/2007/08/mirab-dantas-mares-potiguares.html