Luciano Oliveira - [email protected]

Werner Rydl, em Ponta do Mel: ele também criou um banco cuja sede fica em meio às águas do Oceano Atlântico e que utiliza uma moeda chamada Eternity (Foto: Ricardo Labastier/2024)

Acredite se quiser! Austríaco que mora no litoral de Areia Branca diz ter criado um país em pleno oceano para guardar uma fortuna em ouro

Por Allan de Abreu, Revista Piauí – Edição 225, Junho 2025

Ponta do Mel é um vilarejo espremido entre o mar de tons esverdeados e a caatinga, no litoral de Areia Branca, no Rio Grande do Norte. Como fica distante das praias mais badaladas do litoral potiguar, é a pesca e não o turismo que garante a sobrevivência da maior parte dos 1,1 mil habitantes.

O lugar seria mais um entre tantos povoados de pescadores do litoral brasileiro, não fosse por um detalhe exótico: é lá que mora, há dez anos, o austríaco naturalizado brasileiro Werner Rydl, o homem que declarou à Receita Federal um patrimônio assombroso de R$ 100 bilhões. Caso fosse incluído na lista de bilionários divulgada anualmente pela revista Forbes, Rydl seria a terceira pessoa mais rica do Brasil, superada apenas por Eduardo Luiz Saverin, ex­-sócio de Mark Zuckerberg na Meta, e de Vicky Sarfati Safra, herdeira da famosa família de banqueiros.

Sentado em uma cadeira na recepção de uma pousada em Ponta do Mel, o austríaco me diz que a maior parte de sua fortuna é constituída por um estoque estratosférico de 306 toneladas de ouro – mais do que o dobro das reservas do Banco Central brasileiro. Quando pergunto a Rydl onde guarda tanto ouro, ele aponta com firmeza o dedo na direção do mar, a nordeste de Ponta do Mel, e declara: “Seagarland.”

Seagarland? “É um micropaís sem povo”, diz. Ele conta que o lugar foi criado em 2014 e fica a 90 km da costa brasileira (portanto, em águas internacionais). O nome é um acrônimo de três palavras inglesas: sea (mar), cigar (charuto) e land (terra). Segundo Rydl, o “micropaís” é constituído por um barco flutuante, capaz de submergir, e por um grande depósito de cápsulas com todo o ouro, enterradas no fundo do oceano.

Tanta riqueza contrasta com o padrão de vida espartano de Rydl. Ele tem 67 anos, ralos cabelos castanho-claros e forte sotaque alemão. Vive em Ponta do Mel com a namorada, também austríaca, que aparenta ter a mesma idade dele e não fala português. O casal não tem carro e mora em uma casa muito simples, de cinco cômodos, alugada por R$ 450 mensais.

Antes de ser entrevistado pela Piauí, em meados de setembro passado, Rydl pediu que a namorada costurasse um traje especial para ele usar na ocasião: camisa e bermuda com um tecido estampado com capas de jornais dos Estados Unidos.

“É uma homenagem à importância da imprensa”, justificou.

Cedendo ao narcisismo, o austríaco construiu um site com informações autobiográficas, links de reportagens a seu respeito publicadas na Áustria, uma lista de seus inimigos, informações sobre Seagarland e, no tópico “transparência patrimonial”, incluiu todas as suas declarações pessoais do imposto de renda desde 2007.

Pergunto se Rydl tem as notas fiscais da compra do ouro. Ele diz que copiou todas elas em um cd-rom, que foi apreendido pela Polícia Federal há vinte anos. E como ele conseguiu enterrar toda essa quantidade de ouro no leito do oceano? Ele gagueja um pouco antes de soltar a resposta:

– São máquinas que fazem isso. Máquinas que eu construí.
– O senhor tem fotos dessas máquinas?
– Tenho, mas não posso mostrar.

Eu não resisto e rio alto. Rydl esboça um sorriso discreto e diz:

– Ninguém acredita em mim. Esse dúvida é meu segurrrança.

A dúvida sobre a veracidade das histórias de Rydl poderia resumir-se ao compêndio das mirabolâncias, mas a coisa toda está longe de ser inofensiva. Para a Receita Federal e a Polícia Federal, o austríaco não é mera curiosidade: é um astuto golpista, que descobriu um meio de usar o próprio fisco para criar uma gigantesca lavanderia do crime, útil tanto para legalizar a origem de toneladas de ouro extraídas ilegalmente da Amazônia quanto para esquentar dinheiro do tráfico internacional de cocaína.

No verbete que Werner Rydl criou sobre si mesmo na Wikipédia, ele dizia ser descendente de Maria Leopoldina, a arquiduquesa austríaca que se casou com dom Pedro I e tornou-se a primeira imperatriz do Brasil. O verbete foi retirado do ar por carecer de fontes verificáveis. Certo é que Rydl nasceu em agosto de 1957, em Viena.

Mais velho dos três filhos do dono de uma tinturaria e de uma dona de casa, ele conta que nunca se interessou por brinquedos, nem por fazer amizades. Preferia mexer nas máquinas da fábrica do pai. Também não gostava de estudar.

Confira a reportagem completa sobre o austríaco Revista Piauí – Ed 225 – Junho 25.pdf – Google Drive (Da página 54 a 59)

Com a colaboração de Luiz Fernando Toledo, de Londres; Kevin Yang, de Viena; e Nazima Raghubir, de Georgetown, na Guiana.

Print Friendly, PDF & Email

Compartilhe:

guest

0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments

publicidade